terça-feira, 13 de março de 2012

Manual da Habitação, por Le Corbusier

































Estava eu lendo o livro "Por uma Arquitetura", de Le Corbusier e em certo momento, me deparei com o que eu jamais imaginava existir, o Manual da Habitação, onde ele pontua os fatores mais importantes que uma casa deve ter e como ser, não que seja uma receita de bolo, mas é tão absolutamente maravilhoso que resolvi compartilhar com vocês neste post.

" Olhos que não vêem...

e) Uma casa é feita para ser habitada. Não é possível! - Mas sim! - Você é um utópico!
Para dizer a verdade, o homem moderno se entedia fora de sua alcova; vai ao chá das cinco. O homem e a mulher modernos se entediam em casa; vão ao dancing. Porém, os humildes que não tem círculo se amontoam de noite sob o candelabro e temem circular no dédalo de seus móveis que ocupam todo o espaço e que são toda sua fortuna e todo seu orgulho.
A planta das casas rejeita o homem e é concebida como guarda-móveis. Essa concepção favorável ao comércio do subúrbio Saint-Antoine é nefasta à sociedade. Ela mata o espírito de família, de lar; não há lar, família, crianças, porque é demasiado e incômodo viver.
A liga contra o alcoolismo e a liga para o repovoamento devem endereçar um apelo urgente aos arquitetos; elas devem imprimir o MANUAL DA HABITAÇÃO, distribuí-lo às mães de família e exigir a demissão dos professores da Escola de Belas-Artes.


MANUAL DA HABITAÇÃO

Exijam uma toilette com boa iluminação, uma das maiores peças do apartamento, o antigo salão por exemplo. Uma parede toda de janelas abrindo, se possível, para um terraço para banhos de sol; pias de porcelana, banheira, duchas, aparelhos de ginástica.
Peça contígua: guarda-roupa onde vocês se vestirão e tirarão a roupa. Não tirem a roupa no quarto de dormir. É pouco higiênico e isso cria uma desordem penosa. No guarda-roupa, exijam armários embutidos para roupa e os capotes, não mais altos que 1,50m, com gavetas, cabides etc.
Exijam uma grande sala no lugar de todos os salões.
Exijam paredes nuas no seu quarto de dormir, na sua grande sala, na sua sala de jantar. Compartimentos nas paredes substituirão os móveis que custam caro, devoram espaço e necessitam manutenção.
Reclamem a supressão dos gessos e das portas com quadrados talhados na madeira que implicam um estilo indecente.
Se puderem, coloquem a cozinha bem junto ao telhado para evitar odores.
Exijam de seu proprietário que, para compensar as estátuas de gesso e as tapeçarias, ele instale a luz elétrica em filas escondidas ou refletores.
Exijam o vazio.
Comprem somente móveis práticos e nunca móveis decorativos. Vão aos velhos castelos ver o mau gosto dos grandes reis.
Não coloquem nas paredes mais do que poucos quadros e somente obras de qualidade. Não tendo quadros, comprem as fotografias desses quadros.
Coloquem suas coleções em gavetas ou compartimentos. Tenham o respeito profundo pelas verdadeiras obras de arte.
O gramofone ou a pianola lhes dará interpretações exatas das das fugas de Bach e lhes evitará a sala de concerto e as gripes, o delírio dos virtuoses.
Exijam basculantes nas janelas de todas as suas peças.
Ensinem seus filhos que a casa só é habitável quando a luz abunda, quando os pisos e as paredes são claros. Para entender bem seus pisos, suprimam os móveis e os tapetes do Oriente.
Exijam de seu proprietário uma garagem de automóvel, de bicicleta e de motocicleta por apartamento.
Exijam o quarto dos domésticos no andar. Não deposite seus domésticos na mansarda.
Aluguem apartamentos uma vez menores do que aqueles aos quais seus pais os habituaram. Pensem na economia de seus gestos, de suas ordens e de seus pensamentos.
Conclusão. Em todo homem moderno, há uma mecânica. O sentimento da mecânica existe motivado pela atividade cotidiana. Esse sentimento é, em relação à mecânica, de respeito, de gratidão e estima.
A mecânica traz consigo o fator de economia que seleciona. Há no sentimento mecânico, sentimento moral.
O homem inteligente, frio e calmo adquire asas.
Procura-se homens inteligentes, frios e calmos para construir a casa, para traçar a cidade."

Por uma Arquitetura, Le Corbusier p.81




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